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Adriano Imperador, depressão e traumas: o que um caso no futebol pode falar da sua vida


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19/01/2017 13h00 - Atualizado em 19/01/2017 14h32

Adriano Imperador, depressão e traumas: o que um caso no futebol pode falar da sua vida

Psicóloga fala sobre problemas sociais que podem vir como consequência de episódio traumático na vida de uma pessoa.

Amanda Amaral


 Como ressignificar a própria vida após um grande trauma, como a morte de alguém muito próximo? A pergunta não tem resposta fácil e faz pensar sobre como a sociedade não é preparada para perdas. A psicologia diz que o sofrimento intenso pode tornar o entendimento sobre as coisas nebuloso e, como mecanismo natural humano, a busca para cessá-lo nem sempre encontra caminhos positivos.

 

O caso de Adriano, que em seu auge no futebol ganhou título de Imperador, inspirou a entrevista com a psicóloga e professora Inara Leão Barbosa. Depressivo após a perda do pai, seu maior companheiro, o jogador abriu mão da brilhante carreira no esporte para dar lugar a uma rotina muito diferente, com álcool, drogas e polêmicas envolvendo o mundo do crime. 

 

A aparente impossibilidade de conseguir proteger-se de si mesmo após um grande trauma e os desafios de um recomeço é o tema da conversa com especialista. Leia abaixo:

 

Pessoas que acabam paralisando a vida após um episódio traumático. Que interferência na vida social na vida da pessoa um acontecimento ruim pode causar?

 

Existe, na psicologia, duas formas de analisar. Uma, a que a gente chama de trauma individual, algo absolutamente impossível da pessoa suportar acontece e, individualmente, ela não tem estrutura para aguentar, nem buscar ajuda. Tem outro fator, que acho que convivemos mais, que se chama trauma social, que atinge uma quantidade enorme de pessoas ao mesmo tempo, e cada um vai ter uma resposta conforme esse trauma, mais desprotegido.

 

Tem coisas que independem do sujeito individual. Todos temos fraquezas, o que nos dá força é o grupo, a família, pessoas que fazem certa proteção. As respostas, em geral, têm a ver com as histórias da pessoa. Algumas pessoas conseguem tirar dessa história algo bom. Muitas vezes, essa reação vem em formas de força para ajudar outras pessoas.

 

Quando pessoa não consegue, tende a buscar 'facilidades' para driblar o humor, como álcool e drogas?

 

A gente busca onde acha que vai encontrar conforto, alguma força. Se pessoas próximas não estão disponíveis para ajudar, esses caminhos podem parecer mais fáceis. Geralmente a pessoa muda de grupo, começa a conviver com pessoas que não a critiquem, que não façam parte daquela realidade que te faz sofrer.

 

Os apoios por drogas e álcool fazem parte de uma fase social, a bebida é vendida livremente e causa coisas terríveis. As pessoas tendem a olhar o alcoólatra como alguém que escolheu ‘se afundar’, mas é uma droga, apesar de legalizada. Há quem se entregue aos remédios, já que a sociedade cobra que a tristeza seja superada rapidamente, então muitos controlam as emoções através deles, mas o efeito passa assim que se para de tomar. A tristeza, no fundo, está ali esperando por você.

 

A família, quando também não está em condições, também não pode ajudar. O tranco de coisas pesadas quase ninguém se solidariza a passar junto.

 

A psicologia caracteriza como esse processo de não se conseguir viver o luto? Pessoas que preferem ‘ignorar’ a tristeza se recompensando em alegrias que, na realidade, são ilusórias?

 

A posição das pessoas quando elas passam por situações irreversíveis, o que resta, só o que resta, é lidar com aquilo, não tem jeito. Mas a gente vai encontrar mesmo, pessoas que pareciam ter uma vida leve e organizada, não conseguir equilíbrio depois de um grande sofrimento.

 

Trabalhei muitos anos da minha vida com a questão da perda do status social, da perda do emprego, a falta de perspectiva. Pessoas que tinham a vida resolvida e de repente não têm mais nada, é um choque, é um luto perder a estabilidade.

 

De repente, não saber mais por onde seguir é desesperador, mas a gente não vive do que nos aconteceu ontem. Precisamos entender que vivemos é pelo amanhã, pelos projetos que queremos realizar.

 

Tendemos a enxergar a nossa trajetória como algo reto, sem interferências bruscas, ninguém nos educa que pode tudo sair dos eixos, sem nosso controle. Apesar do luto ser necessário para se entender o que está acontecendo e planejar os passos seguintes, ele deve ser uma etapa que não se perdure demais. É um peso recomeçar, mas a vida é feita deles e se pode fazer isso a qualquer momento.

 

 

 

Há uma negação social em se sofrer? Uma pressão para não aparentar fraqueza?

 

Eu acho. E muitas vezes, as pessoas enxergam o que está acontecendo, mas não dão a devida importância, ninguém quer se envolver com a vida do outro, já que todos têm seus próprios problemas. Dizem que os problemas, por exemplo, da violência contra a mulher, devem ser resolvidos entre quatro paredes, mas eu discordo completamente. A pessoa é um ser social, a sociedade tem responsabilidade sim.

 

Ignorar esse sofrimento e seguir sem lidar diretamente com os traumas pode ter quais consequências futuras?

 

O que se sabe, até então, é que a pessoa pode voltar a passar pela dor, já que ela não construiu, naquele momento, um mecanismo psicológico importante. Construiu outros, alguma resiliência houve, ela pode estar trabalhando, rindo, mas, se passar por outro episódio duro, pode não dar conta.

 

Como essa pessoa, que encontrou certo conforto em hábitos ruins, pode começar a ressignificar a própria vida?

 

Depois que acontece, é muito mais difícil, o melhor sempre vai ser prevenir chegar ao ‘fundo do poço’. A pessoa tende achar que a responsabilidade é dela, se sente envergonhada, foge dos outros, acha que todos a estão julgando. Ela não quer se explicar e, por isso, tende a se isolar e aquilo que eu disse, a buscar grupos que lidam com a vida de maneira completamente superficial.

 

É importante que exista uma pessoa por perto para fazer o papel de ‘chata’, para impulsionar uma reação. Geralmente é a mãe, avó, pai que assume esse papel de insistência, que tentam de verdade ajudar e dão amparo. Família, tradicional ou não, ou seja, pode ser formada por amigos muito próximos, é fundamental.

 

Que tipos de ajuda profissional pode-se buscar nessas situações?

 

Se não há problemas que necessitem mesmo de medicação, que ajuda muito, a princípio terapias de grupo são as mais indicadas. Esses grupos de apoio são formados por pessoas que passaram também por situações difíceis e, assim, se sentir sozinho e julgado tem uma chance menor de acontecer.

 

Para pessoas que se envolveram com drogas e álcool, também, como o modelo dos Alcoólicos Anônimos, que tem dado muito certo. A religião também costuma ser um refúgio, mas há aspectos nessa ajuda que nem sempre são benéficas, porque trocar vício em uma droga em vício pela bíblia pode prejudicar. A psicologia não salva ninguém sozinha, mas consegue mostrar os caminhos até onde dá.

 

 

 

 
 


 

 

Foto: André de Abreu
 

 





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