- mell280
20/02/2025 09h19
A história da Bombril S/A e o seu caminho até a recuperação judicial
Por Marcelo Naufel*
A Bombril S/A é uma das mais tradicionais empresas brasileiras do setor de produtos de limpeza, reconhecida principalmente por sua icônica palha de aço. Fundada em 1948, a empresa rapidamente se tornou um símbolo de qualidade e inovação no mercado nacional.
O nome Bombril é resultado da junção das palavras "bom" e "brilho", evidenciando a principal característica do produto que a empresa inicialmente comercializava: uma palha de aço capaz de proporcionar limpeza eficiente e brilho às superfícies. Durante as décadas seguintes, a marca ampliou sua linha de produtos, lançando esponjas, detergentes, amaciantes e outros itens de higiene doméstica.
Nos anos 1970 e 1980, a Bombril consolidou sua presença no mercado através de campanhas publicitárias memoráveis, incluindo a famosa campanha estrelada pelo ator Carlos Moreno, que permaneceu como garoto-propaganda da marca por mais de trinta anos. Essa estratégia ajudou a empresa a construir uma forte identidade junto aos consumidores brasileiros, sendo hoje em dia a líder em seu mercado.
Entretanto, a partir dos anos 90, a Bombril passou por graves dificuldades, enfrentando diversas disputas societárias e decisões questionáveis da antiga controladora que levaram a autos de infração de natureza tributária a quais segundo a atual gestão são o cerne do atual problema da Bombril.
Recentemente esses problemas tributários, somados a dificuldade no cumprimento de outros compromissos junto a instituições financeiras e assemelhadas, culminou na necessidade de um processo de reestruturação empresarial, visando preservar suas atividades, os aproximados 3.000 postos de trabalho e recuperar a saúde financeira.
A Bombril enfrenta assim uma dificuldade que decorre de problemas tributários e cíveis em especial, que impactaram significativamente seu fluxo de caixa e sua capacidade de operar normalmente. Diante desse cenário, a Bombril optou pela recuperação judicial como um meio de reequilibrar suas finanças e garantir a continuidade das operações. O pedido da Recuperação da Bombril foi protocolada em São Paulo, e encontra-se atualmente em segredo de Justiça. O pedido já teve impacto significativo no valor de mercado da empresa, a qual é listada na Bolsa (BOBR4), com quedas sequenciais de suas ações.
A tributação na recuperação judicial e o caso da Bombril
Antes de mais nada, é importante frisar que a recuperação judicial é um mecanismo previsto na Lei nº 11.101/2005, que permite que empresas em crise financeira possam reorganizar suas dívidas e evitar a falência. Durante esse processo, a tributação da empresa passa por algumas regras específicas.
Há a exigibilidade de tributos, de modo que a empresa continua obrigada a pagar tributos normalmente, visto que o crédito tributário não se submete aos efeitos da recuperação (art. 6º, § 7º A da Lei 11.101/2005 e alterações da Lei 14.112/20). A Legislação atual não impede a cobrança de débitos tributários, mas prevê condições de proteção aos seus ativos essenciais, permitindo a continuidade da atividade da companhia.
Com relação ao parcelamento e negociações especiais, sabemos que as recentes alterações legislativas mencionadas criaram condições especiais para que empresas em recuperação judicial possam parcelar suas dívidas fiscais em até 120 parcelas (Artigo 10-A, inciso V da Lei 10.522/02). Contudo, algumas condições devem ser cumpridas, como a regularidade no pagamento dos tributos correntes. Além desse parcelamento muito mais benéfico que o parcelamento convencional a empresa tem condições de negociações especiais através de transações tributárias, as quais devem acontecer em momentos específicos no curso da Recuperação Judicial. No caso da Bombril, o parcelamento dessas dívidas, segundo sua gestão, seria essencial para aliviar sua carga financeira e permitir que a empresa reorganize suas operações.
Já quando pensamos na imunidade a multas e a juros excessivos, em alguns casos, as empresas podem pleitear a redução de multas e juros incidentes sobre débitos tributários, principalmente se demonstrarem que essas penalidades inviabilizam a continuidade das atividades. Para a Bombril, a negociação de tais encargos se tornou uma estratégia fundamental para garantir a recuperação financeira. Além disso, se houver desconto na renegociação de dívidas junto a credores, esse valor pode ser considerado "receita" para fins fiscais e estar sujeito ao Imposto de Renda e CSLL. No entanto, a jurisprudência e legislação têm discutido formas de mitigar essa tributação para não prejudicar a recuperação da empresa. Para a Bombril, essa questão representa um ponto crítico na busca por um alívio financeiro sustentável.
Por fim, no processo de recuperação judicial, a Bombril segue obrigada a recolher impostos indiretos, como ICMS e ISS, sob pena de sofrer restrições operacionais e possíveis penalidades. Para a empresa, manter esses pagamentos em dia é essencial para evitar sanções fiscais que possam comprometer suas atividades comerciais.
Dessa forma, o caso da Bombril traz uma tentativa da empresa de lidar com uma crise tributária e buscar a manutenção de suas atividades, em especial dentro do regime brasileiro que tem o Estado como uma das principais fontes de despesas das companhias. Resta agora aguardar se tal caminho previsto em nosso sistema jurídico irá permitir a continuidade de uma companhia tão tradicional e que se encontra na casa da maioria dos brasileiros.
*Marcelo Naufel é sócio e coordenador do departamento de Direito de Empresa e Auditoria Fiscal do escritório Almendros Batista e Naufel Advogados Associados