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Incentivos de R$ 10 bilhões para o agro desafiam equilíbrio orçamentário de MS


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17/10/2025 14h58

Incentivos de R$ 10 bilhões para o agro desafiam equilíbrio orçamentário de MS

Governo também amplia estímulos à industrialização com renúncia de R$ 19 bilhões nos próximos três anos

Por Viviane Monteiro, de Brasília


 Às vésperas da implementação do novo sistema tributário nacional, o agronegócio sul-mato-grossense consolida sua posição como principal beneficiário das renúncias fiscais de ICMS no Estado, representando cerca de R$ 10 bilhões em incentivos a serem distribuídos ao longo de 2026, 2027 e 2028, em várias modalidades tributárias, sendo a maior delas a isenção fiscal.

 
 
Os dados constam das estimativas da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2026, encaminhada pelo governador Eduardo Riedel (PP) e já aprovada pela Assembleia Legislativa. Na prática, o cenário aponta um desafio para o governo em equilibrar a competitividade setorial e a saúde fiscal do Estado, que, paralelamente, se esforça para estimular a industrialização, enquanto a economia cresce acima da média nacional.
 
 
 
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Mesmo com impactos indiretos nas contas públicas, a indústria de transformação terá benefícios fiscais de R$ 6 bilhões em 2026, R$ 6,3 bilhões em 2027 e R$ 6,7 bilhões em 2028, na modalidade de “crédito presumido (ICMS)”, também chamados de créditos outorgados. Na ponta do lápis, ao longo dos próximos três anos, esses impactos somam R$ 19 bilhões nas contas públicas estaduais.
 
Na prática, os créditos presumidos funcionam como uma forma indireta de incentivo fiscal, muito utilizada pelos estados para reduzir a carga efetiva de ICMS de determinados contribuintes ou setores.
 
Apesar da robusta destinação de isenções fiscais ao agronegócio, o presidente do Corecon-MS (Conselho Regional de Economia de Mato Grosso do Sul), Diogo Costa da Silva, chama atenção para o esforço do Estado em promover a industrialização. “Se comparar os benefícios fiscais do agronegócio com os da indústria de transformação, eles não são tão expressivos. Os incentivos fiscais para o agronegócio tendem a ser mantidos porque carregam o ‘slogan’ de celeiro do mundo”, avalia.
 
Ele observa ainda que o volume expressivo de desonerações voltadas ao agronegócio reflete também a influência política da bancada ruralista, ainda que o setor continue sendo o principal motor econômico de Mato Grosso do Sul.
 
 
Presidente do Corecon-MS (Conselho Regional de Economia de Mato Grosso do Sul), Diogo Costa da Silva (Foto: Divulgação)
O especialista do Corecon-MS avalia também que o tarifaço dos Estados Unidos sobre exportações de produtos agrícolas, como a carne, pode ter influenciado a decisão do governo de conceder benefícios fiscais robustos ao agronegócio, a fim de sustentar o setor nos próximos três anos, em meio ao esforço de prospectar novos mercados.
 
Silva chama atenção ainda para os estímulos fiscais voltados à celulose, dentro do segmento agroindustrial. Segundo ele, os benefícios fiscais no conjunto do agronegócio podem ser impulsionados pela celulose, que, em contrapartida, deve responder pela geração de empregos e pela capacitação de mão de obra, considerado um gargalo no Vale da Celulose, diante da expansão do setor no Estado.
 
“As cidades estão recebendo investimentos da indústria da celulose. É preciso verificar como as prefeituras estão trabalhando em coordenação com o governo do Estado, porque, para abrigar uma indústria de grande porte, que requer mão de obra capacitada, em alguns casos é preciso importar essa mão de obra. Isso também gera custo, que pode acabar impactando nos incentivos fiscais. Ou seja, acaba sendo necessário conceder um incentivo a mais.”
 
A despeito disso, o especialista avalia como extremamente positivo o esforço de industrialização do Estado, considerando que os empregos da indústria oferecem salários maiores, exigem maior qualificação e contribuem mais para a distribuição de renda. “O nosso Estado, tradicionalmente, foi e é bastante agrícola e, nesse caso, querendo ou não, a renda fica um pouco concentrada em razão do avanço da mecanização no campo.”
 
 
O entendimento é de que o agronegócio não gera o chamado “efeito multiplicador” de emprego e, com isso, a renda tende a se concentrar.
 
Ainda no caso do agronegócio, que abrange agricultura, pecuária, produção florestal (celulose), pesca e aquicultura, somente em isenção fiscal, os benefícios projetados são de R$ 2,16 bilhões em 2026, R$ 2,29 bilhões em 2027 e R$ 2,42 bilhões em 2028. Nesse caso, o impacto dessas renúncias fiscais nas contas públicas é estimado em R$ 6,87 bilhões ao longo de três anos.
 
Outro benefício fiscal significativo ao agronegócio, conforme o documento da LDO, decorre da “modificação da base de cálculo (BC) do imposto”, que representa a atualização da BC da máquina estatal prevista para deixar de arrecadar o tributo, devendo alcançar R$ 925,9 milhões em 2026, R$ 981,4 milhões em 2027 e R$ 1,038 bilhão em 2028. O governo prevê ainda anistia de frações de valores para o setor.
 
 
No caso da indústria de transformação, a isenção fiscal prevista é de R$ 110 milhões em 2026, R$ 116,6 milhões em 2027 e R$ 123,3 milhões em 2028. Já o setor de “indústrias extrativas” terá isenções de R$ 204,2 milhões, R$ 216,5 milhões e R$ 229,1 milhões, respectivamente. Entre outros segmentos, o de “comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas” também será beneficiado, com isenções projetadas em R$ 354,6 milhões no próximo ano, R$ 375,8 milhões em 2027 e R$ 397,6 milhões em 2028.
 
No total, incluindo todos os setores, a renúncia fiscal de Mato Grosso do Sul com o ICMS, em suas várias modalidades, é estimada em R$ 11,9 bilhões no próximo ano, R$ 12,6 bilhões em 2027 e R$ 13,4 bilhões em 2028, segundo a LDO. Ou seja, ao longo dos próximos três anos, o impacto fiscal soma R$ 37,9 bilhões.
 
 
Governador Eduardo Riedel em visita a fábrica da Suzano (Foto: Divulgação/Governo MS)
Metas fiscais - Enquanto o governo defende os incentivos como mecanismo de estímulo à atratividade econômica e à geração e preservação de empregos, especialistas alertam para a necessidade de reavaliar o custo-benefício das renúncias. Isso porque, quanto maiores elas são, mais difícil se torna o cumprimento das metas fiscais, a menos que haja compensação via aumento de arrecadação em outros setores, corte de gastos ou endividamento do Estado. A LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) exige contrapartida para qualquer concessão de benefício, garantindo o equilíbrio entre receitas e despesas.
 
 
A Secretaria da Fazenda não respondeu até o fechamento desta reportagem para esclarecer a contrapartida de receita diante das renúncias fiscais robustas previstas para os próximos três anos. Para 2026, a LDO projeta receita de R$ 27,19 bilhões, alta de 2,98% em relação ao orçamento de 2025 (R$ 26,4 bilhões).
 
Conforme o documento, as metas para o resultado primário, saldo entre o que o governo arrecada e o que gasta, sem contar os juros da dívida pública, são superavitárias para os próximos três anos. Em 2026, por exemplo, a meta de superávit primário, considerando a contribuição do regime previdenciário, representa 0,05% do PIB previsto para o Estado; e 0,59% da receita corrente líquida. Sem essa contribuição, porém, o resultado primário seria deficitário em 1,19% do PIB ou 13,19% da receita corrente líquida estadual.
 
Apesar das críticas aos possíveis descompassos entre receita e despesa, o presidente do Corecon-MS avalia que as contas do Estado estão sob controle. “Não tem nada fora do controle. O que pode, talvez, fazer alguma coisa sair do controle seja algum tipo de fator externo, por exemplo, o agravamento da guerra comercial entre EUA e China. Ou uma reviravolta nas eleições do próximo ano.”
 
 
Diante da transição para o novo modelo nacional de tributos sobre o consumo, a partir de 2032, a tendência é que os estados revisem gradualmente seus programas de incentivos. Nesse contexto, Mato Grosso do Sul poderá ser forçado a rediscutir o papel das renúncias como ferramenta de política econômica — especialmente diante da meta de ampliar a arrecadação e reduzir a dependência de poucos setores estratégicos.
 
O entendimento do titular do Corecon-MS é que haverá alternativas para a manutenção do modelo de renúncia fiscal, já que ele funciona como instrumento de atração de indústrias e desenvolvimento regional. “Se taxar ou aplicar o imposto de imediato, uma empresa, por exemplo, não terá como se equilibrar. Então, esses incentivos vêm muito mais para fazer com que a empresa ou o setor se estabilize e, aos poucos, você vai retirando. Mas o problema é o tempo que isso já está enraizado na nossa cultura”.
 
 
 




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