16/12/2025 08h55
Clima imprevisível já altera consumo, estoque e planejamento de pequenos negócios
Pesquisa do Sebrae mostra que 63% das empresas foram afetadas por eventos extremos. Jovens empreendedores da CONAJE pedem que a agenda climática coloque o Norte no centro do debate nacional
A rotina dos pequenos negócios brasileiros já mudou com as alterações climáticas. O impacto aparece no caixa, no comportamento do consumidor e, cada vez mais, na própria disponibilidade de produtos. É o que confirma a pesquisa Pequenos Negócios e as Mudanças Climáticas no Brasil, do Sebrae, segundo a qual 63% das micro e pequenas empresas foram afetadas por eventos climáticos extremos, como ondas de calor, tempestades e períodos prolongados de seca. Entre elas, 94% precisaram adotar pelo menos uma medida emergencial para manter as operações em momentos de escassez hídrica.
A mudança de cenário é perceptível no varejo de alimentos e na gastronomia. Willyan Francescon, vice-presidente da CONAJE e empreendedor em Campo Grande (MS), resume o efeito direto no consumo. “O clima interfere muito no consumo. O calor prolongado derrubou a procura por vinho e reduziu os dias de faturamento mais alto. Perdemos aquela previsibilidade que o inverno trazia”.
Consumo muda com o tempo; oferta também
Segundo o levantamento, ondas de calor intensas foram o evento que mais afetou as empresas, citadas por 41% dos entrevistados. A percepção coincide com o que Francescon observa em seus restaurantes e lojas: invernos mais curtos reduzem a venda de vinhos e comprimem margens.
O problema não se limita ao consumo. A cadeia de abastecimento sente os efeitos de safras instáveis e de um clima cada vez mais imprevisível. 48% das empresas já enfrentaram dificuldades de fornecimento por causa de impactos ambientais. “Em alguns anos simplesmente não conseguimos comprar certos rótulos, porque a safra não ajudou. O clima acaba ditando o que estará disponível”, afirma.
No varejo de alimentos, indisponibilidade significa cardápios mais enxutos, custos maiores e necessidade de estoques estratégicos.
Adaptação virou parte da operação
O estudo mostra que, diante da seca, empresas adotam medidas preventivas como captação de água (65%) e reuso (51%). Nos períodos de calor extremo, 58% investiram em refrigeração e 38% reforçaram o isolamento térmico.
Francescon confirma a mudança de postura. Seus negócios ampliaram a oferta de vinhos brancos e espumantes, ajustaram menus ao clima e reforçaram estoques de produtos sensíveis. Para ele, esse estilo de vida mais ativo com o calor muda a forma de consumir. “As pessoas vão mais para parques e buscam alimentos mais leves. A gente precisa acompanhar esse comportamento”, explica.
Para ele, o maior desafio dos pequenos empresários não é apenas reagir, mas entender o clima como parte de um sistema maior. “Muitos olham só o micro e o que acontece na semana. Quem observa o todo percebe tendências e evita erros. Um fornecedor nosso plantou mais uva tinta, mas a demanda migrou para rótulos brancos. Sem essa leitura de contexto, o planejamento falha”.
Pesquisa acende alerta sobre maturidade climática
O levantamento revela que cerca de 70% das empresas reconhecem os riscos climáticos. Para a CONAJE, o dado mostra que a percepção já existe, mas ainda não se traduz plenamente em estratégia.
Segundo Francescon, a juventude empreendedora pode acelerar essa virada cultural. “O clima é que vai ditar o nosso próximo jogo na produção de alimentos. Quem entender isso cedo sai na frente”.
Agrônomo de formação e empreendedor, ele enxerga o paralelo entre agricultura, mercado e varejo. “Nada é linear. Vivemos em um mundo em mudança. O clima molda o comportamento do consumidor e a disponibilidade de produtos”, afirma. Para ele, ignorar esse fator hoje é comprometer o resultado de amanhã.
Por que o Norte precisa estar no centro
O estudo mostra diferenças regionais na percepção dos riscos. Nordeste (76%) e Sudeste (75%) lideram o reconhecimento dos impactos climáticos, reflexo direto da alta exposição a eventos extremos. Centro-Oeste e Norte aparecem com 62%, um patamar intermediário que, no caso do Norte, contrasta com a relevância ambiental da região. Já o Sul registra o menor índice, com 58%.
Para Francescon, isso reforça a urgência de colocar a região no centro da agenda climática do empreendedorismo jovem. “O legado amazônico precisa ser traduzido para o resto do país”, afirma. Para ele, não basta discutir clima, é preciso transformar isso em competitividade e inovação para quem empreende.
Willyan ainda lembra que a região tem sido palco de debates que cruzam inovação, sustentabilidade e negócios. Belém sediou, no dia 4 de dezembro, o Summit Legado Amazônico, dentro da programação do Congresso Nacional dos Jovens Empresários 2025, onde reuniu jovens lideranças de todo o país para discutir como o clima, tecnologia e modelos de negócio podem moldar a realidade dos pequenos empreendedores.
Para ele, encontros como esse ajudam a transformar percepção em prática.“Colocar o Norte no centro amplia a visão do país sobre clima, produção e consumo, e é um passo essencial para transformar essa discussão em estratégia empresarial de futuro”.
Caminhos possíveis para micro e pequenos negócios
De acordo com Francescon, três frentes emergem como prioritárias:
- Planejamento de riscos e estoques críticos
A imprevisibilidade climática exige leitura de safra, sazonalidade e oferta. Estoques estratégicos se tornam essenciais.
- Portfólio adaptado ao clima
Cardápios sazonais, produtos mais refrescantes e serviços ajustados ao comportamento local de consumo.
- Capacitação e redes de apoio
Com a falta de assessoria técnica acessível a grande parte das MPEs, redes como a CONAJE ajudam a reduzir essa lacuna com orientação, formação e troca de experiências. Na avaliação de Francescon, não existe futuro para os pequenos negócios sem leitura climática. O clima afeta o que é produzido, o que é vendido e como o consumidor se comporta. Adaptar-se, diz ele, deixou de ser opção e passou a ser condição de sobrevivência.
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Sobre a Conaje
A Confederação Nacional de Jovens Empresários (Conaje) é uma entidade sem fins lucrativos que atua há 25 anos no fomento ao empreendedorismo e na capacitação de jovens lideranças empresariais. Está presente em 17 estados e reúne mais de 15 mil jovens empresários. Com 20 movimentos locais ativos, a Conaje promove ações voltadas à formação de lideranças, à geração de negócios e ao fortalecimento de políticas públicas para o desenvolvimento de micro e pequenas empresas. Entre os projetos de maior relevância da entidade estão o Feirão do Imposto, o Conaje Capacita, a Semana Global do Empreendedorismo e o Concurso Nacional de Startups. A Conaje também representa o Brasil em instâncias como BRICS Jovem, FIJE (Federação Ibero-Americana de Jovens Empresários), Mercosul Jovem e G20, na articulação de pautas do empreendedorismo nacional para o cenário internacional. |
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