A demora das respostas para o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes traz à tona problemas estruturais no esclarecimento de homicídios no país

Seis anos depois dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, investigações da Polícia Federal finalmente apontaram dois suspeitos de serem os mandantes do crime e um delegado suspeito de atrapalhar as investigações. O Instituto Sou da Paz deseja que a conclusão dessa etapa e consequente responsabilização dos mandantes possa confortar o sentimento de pesar dos familiares e amigos das vítimas, agravado pela sensação de impunidade diante da demora na completa elucidação do crime.

Como mostramos na 6ª edição do relatório Onde Mora a Impunidade, o Rio de Janeiro esclarece apenas cerca de 23% dos homicídios cometidos no estado, bem abaixo da já preocupante média nacional de 35% de esclarecimentos. Em todas as edições o estado apresentou índices baixos, tendo chegado ao mais grave de 11% em 2017. Esse indicador, somado a outros indicativos, como a alta rotatividade de delegados na unidade de homicídios da capital, poderia ter guiado uma avaliação detalhada que identificasse os indícios de corrupção com muito mais antecedência.

Os fatos apontados no inquérito sobre as mortes de Marielle e Anderson evidenciam problemas estruturais que afetam não apenas a segurança pública, como outras esferas administrativas e políticas do estado. O processo de investigação foi marcado por uma sequência de falhas, desde os trabalhos iniciais no local do crime. A coleta irregular dos projéteis impediu análises periciais completas, gravações de estabelecimentos comerciais da região demoraram a ser coletadas, houve quebras na cadeia de custódia de evidências, testemunhas foram ignoradas, depoimentos de envolvidos deixaram de ser tomados e mandados de busca e apreensão não foram cumpridos. Por fim, a condução da apuração foi prejudicada pela constante troca de delegados e mudanças na equipe do Ministério Público que monitorava o caso, o que culminou na federalização da investigação.

No Brasil existem diversos exemplos de boas práticas de investigação de homicídios, que têm contribuído para melhorar a taxa de esclarecimento em diferentes estados. Na publicação Diretrizes Nacionais de Esclarecimento de Homicídios, o Sou da Paz, apoiado por uma rede de policiais, peritos criminais e promotores de justiça, sistematizou um conjunto de recomendações práticas que podem e devem ser disseminadas para mais polícias. Dentre os pontos destacados na publicação, estão a devida preservação do local do crime, articulação mais próxima com o Ministério Público, fortalecimento das perícias técnicas e a contínua mensuração das taxas de esclarecimento de homicídios.

“Esperamos que o estarrecimento diante da realidade exposta por esse caso ajude a impulsionar medidas efetivas para aprimorar as respostas do poder público frente aos homicídios, para que nenhuma família fique sem resposta, os autores sejam responsabilizados e a polícia tenha mais informações sobre como os homicídios acontecem e seja capaz de preveni-los de forma mais eficiente”, afirma Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz. “Aperfeiçoar o desempenho investigativo e aumentar o esclarecimento de homicídios depende de uma atuação coordenada entre secretarias de segurança estaduais, Ministério Público e Poder Judiciário, com o devido apoio e direcionamento do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Mas antes de tudo, depende da decisão política de priorizar a investigação criminal em vez das tradicionais operações policiais espetaculosas, que não geram resultados de longo prazo, além de produzirem mortes e injustiças”, diz Carolina.

 

 

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