- mell280
25/08/2011 09h50
Indústria deve travar crescimento da economia do país
A indústria brasileira deverá puxar para baixo o crescimento da economia nacional neste ano. O real valorizado - que ampliou muito o acesso de produtos importados ao país - e altos estoques, que sofreram em parte com uma redução do consumo, fazem com que economistas reduzam as previsões do resultado do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) no segundo trimestre, que será divulgado oficialmente pelo IBGE na próxima semana. Esses fatores combinados com um temor de uma demanda mundial mais fraca por causa da atual crise do endividamento dos países ricos também desidratam as projeções da economia brasileira no segundo semestre.
Outro componente do PIB que está reduzindo a previsão, porém pela ótica da demanda, são os investimentos, que se expandem aquém do imaginado previamente. A Tendências Consultoria, por exemplo, acredita que a indústria vai registrar uma retração de 0,9% no segundo trimestre em relação ao primeiro, enquanto a queda dos investimentos, na mesma comparação, será de 1,6%. Com isso, a consultoria reduziu na semana passada sua projeção do PIB do segundo trimestre de 1,1% para 0,7%. Assim, o crescimento do ano, antes previsto em 3,9%, deverá ser de 3,5%.
- O responsável por isso é a indústria, que está com estoques altos em diversos segmentos. Seus problemas são estruturais, envolvem o câmbio e a perda de competitividade. Acreditamos que no ano, a expansão do setor será de 2,1% mas esperamos que isso melhore em 2012, quando a produção industrial deve crescer 4,5% e o PIB 3,7% - afirmou Alessandra Ribeiro, economista da Tendências.
A Austin Rating acredita que a indústria esteja puxando para baixo a economia, embora, segundo o economista da entidade, Alex Agostini, o setor agropecuário também esteja um pouco mais fraco do que o estimado. Ele diz que no segundo trimestre a economia cresceu 0,54% em relação ao primeiro trimestre:
- Esse ritmo deve se manter no segundo semestre o que é até bom, pois reduz um pouco a pressão inflacionária.
Para muitos economistas, a recuperação só deve vir a partir de 2012, quando o governo já estará tomando medidas para aquecer a economia, que começará a sentir mais os impactos da crise global:
- O segundo semestre deve ter um crescimento pouco abaixo de 4%. A indústria será o maior fator de baixa e certamente é a crise internacional a maior causa dessa desaceleração na produção industrial. É ela que justifica uma perspectiva pior para o restante do ano - afirma Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que disse que deve revisar em breve a projeção do crescimento da economia no ano de 4,2% para 3,8% por causa da indústria. Estoques elevados pressionam produção A indústria brasileira, setor que levou o maior tombo com a crise de 2008, avança no segundo semestre com estoques acima do que especialistas consideram ideal. Para evitar mais produtos nos pátios, muitas fábricas deram uma trava na produção. E, assim, a produção industrial chega a ser 1,6% menor do que a de setembro de 2008, antes da quebra do Lehman Brothers. Entre junho e julho, o estoque de matérias-primas da indústria eletroeletrônica passou de 31% para 40% e o de produtos acabados de 32% para 44%. Na indústria automobilística, o estoque, que já não era pequeno, subiu ainda mais em julho, chegando a 367,1 mil unidades (o equivalente a 36 dias de vendas), contra 341,9 mil unidades em junho (33 dias de vendas). Encalhes também aparecem em outro setores como metalurgia, siderurgia - que está com quase o dobro do estoque normal - vestuário, calçados e farmacêutico. - A desaceleração da produção industrial é resultado de juros altos e de medidas para conter o crédito. Cerca de 15% do PIB brasileiro virem do setor externo, não há dúvidas de que alguns setores são afetados pela desaceleração dos EUA e da Europa - disse Fernando Abrita, economista do IBGE. Há alguns dias, a General Motors informou que irá suspender a produção em dois sábados de agosto em Gravataí (RS) para ajustar os estoques à demanda. - A crise externa ainda não nos afetou. Os estoques são reflexo da queda nas vendas provocada pela restrição ao crédito do governo desde o início do ano, mas a desconfiança no consumidor com a crise internacional pode prejudicar o setor - afirmou Humberto Barbato, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), lembrando que levantamento da associação mostra que subiu de 17% para 36% entre junho e julho a parcela de empresas que tiveram queda nas vendas e encomendas. No caso da Associação Brasileira de Papel Ondulado (ABPO), as projeções de produção vem recuando. O setor chegou a esperar, inicialmente, alta de 5% neste ano. Um número que caiu e agora para 2,0% e 2,5%. - Houve um freio no consumo, em relação às nossas expectativas. Mas o setor, um dos termômetros do mercado, continua crescendo - disse o presidente da entidade, Ricardo Lacombe Trombini. Na avaliação de Rogério Cesar de Souza, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), a situação não está pior pois as empresas brasileiras estão "calejadas". Segundo ele, a produção industrial no primeiro semestre foi muito fraca - principalmente pelo temor da concorrência com importados, que cresceram muito no Brasil, e se antecipando ao arrefecimento da economia. - Vejo um pouco de excesso de estoques em setores como vestuário, calçado, têxtil e madeira, setores fortemente atingidos pela alta das importações, mas creio que as empresas deverão resolver isso dosando a produção daqui até o fim do ano - disse. O economista Aloisio Campelo, da Fundação Getúlio Vargas, disse que "não há desequilíbrio imenso do estoque da indústria, mas alguns setores estão sofrendo mais do que outros". Segundo ele, o estoque ficou bastante elevado na passagem de 2010 para 2011, mas acabou se acomodando logo em seguida. Nos últimos meses, no entanto, o encalhe voltou a crescer no setor de metalurgia, siderurgia, vestuário, calçados e farmacêutico. De acordo com ele também começa a crescer o estoque na indústria mecânica e de material eletrônico de comunicação. Marco Polo de Mello Lopes, presidente do Instituto brasileiro de siderurgia, está preocupado. Ele afirma que, por causa das altas importações ocorridas no ano passado - quando o aço estrangeiro representou 20% do mercado nacional, contra média histórica de 4% a 6% - ainda há muito estoque no setor: - Normalmente o setor trabalha com um estoque médio de dois meses. Estamos agora com 3,7 meses, é cerca de 1,2 milhão de toneladas de aço. Guilherme Mercês, gerente de pesquisas econômicas da Firjan, acredita que alguns setores, como o automobilístico, estão com estoques acima do ideal. Mas, de uma maneira geral, ele acredita que as indústrias do estado se planejaram melhor e não serão pegas na surpresa, como na crise de 2008. Ele lembrou que o setor no Rio tende a desacelerar menos que o resto do país: - No primeiro semestre, o faturamento do setor no estado cresceu 10,4%. Estimamos fechar o ano com alta de 10%. Temos muitas indústrias no Rio voltadas para o mercado doméstico. Mas a desaceleração da economia não afetou a venda de alimentos e bebidas no país. Dois motivos explicam a resistência às turbulências: a renda do brasileiro não caiu e alimentos, por serem produtos muito básicos, são os últimos a serem cortados do orçamento. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (Abia), as vendas reais do setor subiram 6,8% no primeiro semestre e o volume de produção, 5,7%. - É evidente que o cenário assusta todos. Inclusive o consumidor que começa a pensar mais nos gastos e sente receio de emprego. Mas essa crise toda ainda está países do euro e, claro, nos EUA. O Brasil não está sentindo muito, porque o que o setor depende muito do mercado interno e, ainda no nosso caso, as compras de China no agronegócio. Claro que, em outros segmentos a presença da China é complicada. - explica Dênis Ribeiro, diretor do Departamento de Economia da entidade.